Horas Extras e Banco de Horas

HORAS EXTRAS E BANCO DE HORAS

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Há muitas dúvidas sobre em que situações é legítima a instituição de banco de horas, e até mesmo sobre a constitucionalidade do instituto, criado pela Lei 9.601/98. É um instituto de flexibilização do contrato de trabalho, no qual o empregado trabalha mais num determinado dia para prestar serviços em um número menor de horas em outro.

O empregado poderá trabalhar ter até duas horas prorrogadas por dias, até o limite de 10 horas, sem receber adicional de horas extras. A compensação semanal pode ser fixada através de acordo bilateral escrito, acordo ou convenção coletiva de trabalho. O acordo tácito, sem anuência por escrito do empregado, não é válido. Já a compensação anual só pode ser fixada mediante intervenção sindical.

Note-se que o aumento de horas de trabalho verifica-se apenas na jornada, enquanto a carga horária semanal deve permanecer inalterada, conforme a expõe o art. 7º, XIII, da Constituição Federal e art. 59, da Consolidação das Leis do Trabalho, onde temos como regra geral a jornada de trabalho não superior ao limite de oito horas por dia ou 44 horas semanais.

É aqui, no entanto, onde muitos empregadores cometem erros, pois se as horas extras forem prestadas com habitualidade, o instituto do banco de horas estará descaracterizado. Assim, se o empregado faz habitualmente 10 horas por dia, por exemplo, as duas horas excedentes de oito deverão ser pagas como extras e não poderão ser compensadas, como preconiza o inciso IV do verbete 85 do Superior Tribunal do Trabalho.

Note-se que a compensação é uma exceção à regra, deverá acontecer em episódios eventuais. Seu objetivo é melhorar a relação de trabalho com horários mais flexíveis, e o caso de habitualidade faz a compensação perder seus efeitos, trazendo prejuízos à saúde do empregado.

Nessa esteira, entende-se que a compensação anual gera “agressão que propicia à saúde, higiene e segurança laborais obscurece, significativamente, o sentido favorável ao trabalhador de que era classicamente dotado e o coloca em confronto com o art 7, XXII, da Constituição, que assegura aos empregados direitos a normas de saúde, higiene e segurança que reduzem (e não elevem) os riscos inerentes ao trabalho. Sob esta ótica, portanto, o critério inaugurado em 1998, no Brasil (compensação anual), teria ultrapassado a fronteira máxima compatível a Carta da República (compensação intersemanal, respeitado o mês), por instituir mecanismo que amplia (em vez de reduzir) os riscos inerentes ao trabalho”(DELGADO, 2006, pág. 865).

O instituto acaba por suprimir o direito às horas extras. A Constituição da República autoriza a extensão da hora de trabalho, permite sua compensação, mas em nenhum momento autoriza a supressão ou renúncia ao direito do pagamento das horas extras, os direitos constitucionalmente previstos deveriam ser tidos como parâmetros pelas normas infraconstitucionais. É um instituto que favorece somente o empregador.

Na verdade, a edição da norma se deu em período de crise econômica, em que o desemprego batia recordes. Assim, seu objetivo era evitar demissões em massa, sacrificando alguns direitos trabalhistas em prol do controle da situação.

Embora seja um instituto válido para evitar dispensa de empregados nos momentos de baixa produção, entende-se que a solução adotada atinge somente a parte mais fraca da relação jurídica, que, pelo princípio protetor, deveria ser o menos atingido.

Assim, o interprete da norma deve estar consciente desta realidade ao aplicá-la, dosando em cada caso concreto a aplicação razoável e justificada do instituto, garantindo ao trabalhador o máximo de proteção possível.

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Guilherme Schmidt
Advogado
OAB/SP 344.761

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